Projeto que resgata história de artista negra avança em Curitiba

Iniciativa de Carol Dartora, que denuncia o apagamento de pessoas negras e resgata a identidade de Emerenciana Cardoso Neves, foi aprovado na CCJ

Ela foi uma artista. Ela tem um nome. Ela tem uma história. Mas, como acontece com a maioria das pessoas negras, seu talento, sua identidade e sua história foram apagados. Emerenciana Cardoso Neves é retratada em uma escultura na região central de Curitiba, mas sem a divulgação do seu nome verdadeiro, sua imagem ficou conhecida de forma pejorativa como “Maria Lata D’água”.

Mas essa situação de racismo estrutural pode estar com os dias contados. O projeto de lei 008.00011.2022, de autoria da ex-vereadora Carol Dartora (PT), que denomina de “Emerenciana Cardoso Neves” a fonte de água localizada na Praça José Borges de Macedo, onde está instalada a escultura com a imagem da artista, foi aprovado nesta terça-feira (4) na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara Municipal de Curitiba (CMC).

“Esse projeto é uma demanda antiga por ressignificação dos bens públicos, para dar visibilidade à contribuição das mulheres negras e da população negra na cidade de Curitiba. O apagamento de Emerenciana Cardoso Neves não foi obra do acaso. Foi mais uma das faces do racismo. Por isso, lutamos para mudar essa história”, explica a parlamentar.

Leia também

Tramitação

A aprovação na CCJ é condição obrigatória para que os projetos de lei sejam levados para votação por todos os vereadores, em plenário. Durante a discussão do texto, o vereador relator, Mauro Ignácio (União), apresentou parecer contra a tramitação do projeto, mas foi vencido pelo relatório do vereador Angelo Vanhoni (PT), que obteve a maioria dos votos.

Agora, a proposta segue para análise da Comissão de Educação, Turismo, Cultura, Esporte e Lazer, que deve emitir parecer de caráter apenas opinativo. Só depois o projeto estará pronto para ser deliberado em plenário.

Em 2021, Carol Dartora já havia apresentado o mesmo projeto, mas a maioria dos membros da CCJ naquela época votaram contra a tramitação, resultando no arquivamento da proposta.

Em 2022, o texto foi apresentado novamente e, antes de assumir o mandato de deputada federal, a parlamentar convidou as vereadoras Professora Josete e Giorgia Prates – Mandata Preta, ambas do PT, para ingressarem como co-autoras da iniciativa.

Placa explicativa

Além do projeto de lei em tramitação no Legislativo, o trabalho de reparação histórica também conta com o apoio de uma emenda parlamentar. Carol Dartora destinou para o orçamento da Prefeitura de Curitiba R$ 20 mil para a implementação de uma placa e um totem explicativo com resgate histórico da figura de Emerenciana Cardoso Neves.

A estrutura a ser instalada ao lado da escultura deverá ter o seu conteúdo desenvolvido com a participação de pesquisadoras e historiadoras reconhecidas pela pesquisa sobre a vida e a obra de Emerenciana.

Uma grande artista

Formada em Escultura pela antiga Escola Nacional de Belas Artes, no Rio de Janeiro, Emerenciana Cardoso Neves foi uma mulher negra, grande artista conhecida também pelo pseudônimo de Anita Cardoso Neves.

Sua imagem foi transformada em escultura pelo artista paranaense Erbo Stenzel. A obra de arte leva o nome de “Água pro Morro” e é o destaque de uma fonte de água instalada na Praça José Borges de Macedo, no centro de Curitiba.

O monumento foi inaugurado em 15 de maio de 1996. Na base da escultura havia uma placa com os dizeres: “Maria Lata D’água. Fonte edificada pela cidade de Curitiba em maio de 1996 para celebrar a memória do escultor local Erbo Stenzel. 1911-1980. Rafael Greca de Macedo – Prefeito”.

A placa não se encontra mais inserida no monumento e não se sabe as razões. No entanto, em nenhum momento era citado o nome da obra (Água pro Morro), muito menos a identificação da mulher representada (Emerenciana ou Anita Cardoso Neves).

Pesquisas realizadas para resgatar a história da artista encontraram informações sobre sua atuação na elaboração de enredos de escolas de samba para a Acadêmicos do Salgueiro, Unidos de Vila Isabel, entre outras.

Também foram localizados registros em que a escultora declarou possuir diversas “diversas medalhas de prata e bronze conquistadas no salão dos Artistas Brasileiros e Salão Rural”. Além disso, ela ainda era poetisa e declamadora.

De acordo com as informações obtidas, Emerenciana faleceu na cidade do Rio de Janeiro, em 24 de novembro de 1991, aos 73 anos.