Um dos aspectos mais irritantes do movimento de privatização é que eles fingem ser progressistas. Eles não são. Eles são reacionários, e eles têm a história para provar isso. Eles roubaram a palavra “Reforma”, para que pudessem fingir que queriam melhorar as escolas, em vez de admitir que querem substituir as escolas públicas por escolas religiosas, escolas particulares, escolas com fins lucrativos, escolas on-line, tudo menos as escolas públicas. Dica: Destruição não é reforma. (Ravitch, 2017)
Contexto de surgimento do novo ensino médio
Aprovadas em um turbilhão desesperado e de urgência durante o governo de Michel Temer (2016-2018), a Medida Provisória no. nº 746/2016 casada com a Base Nacional Comum Curricular atropelaram um processo de anos de construção de um Plano Nacional de Educação, que estabeleceu metas e obteve acúmulos a respeito das políticas públicas que deveriam ser desenvolvidas em torno da pauta da educação no Brasil.
Marilda Costa e Leonardo Almeida da Silva (2019) dizem: “Os acontecimentos que levaram o país ao impeachment de 2016 trouxeram consigo consequências para a democracia brasileira e também para a educação enquanto bem público — direito humano básico de todos — e não poderiam promover efeitos mais danosos à escola pública e a seus professores, tal como ocorrido após essa lesiva ruptura institucional e sua agenda regressiva em termos de direitos”. Não é sem motivos que essa reforma foi aprovada durante um período turbulento da democracia brasileira e com baixa participação popular e acadêmica da nossa nação, mesmo com resistência extensa — principalmente quando colocada em pauta a Primavera Secundarista, onde mais de mil escolas foram ocupadas pelo país afora, em uma jornada de lutas contra uma reforma autoritária e descolada dos diálogos com a base estudantil e educacional.
O modelo proposto foi feito de maneira muito rápida a fim de viabilizar uma educação voltada para o mercado de trabalho, removendo do currículo disciplinas como Sociologia e Filosofia, escancarando o projeto de sociedade que os golpistas desejavam para o Brasil: uma educação sem caráter crítico. É dessa forma que a extrema direita encontrou um caminho para o poder, na aurora de um novo momento onde as instituições se enfraquecem a partir da investida antidemocrática.
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Desarticulação da educação crítica
De uma maneira mais técnica, o Novo Ensino Médio (NEM), tinha como uma das intenções aumentar as horas das disciplinas gerais básicas de 2400 Horas para 3000 Horas porém, sabemos que as disciplinas gerais básicas sofreram uma diminuição de 2400 horas para 1800 horas, uma perda irreparável para os estudantes do ensino médio. Esse “espaço” foi preenchido com disciplinas como Empreendedorismo Jovem, a fim de fazer com que os jovens “se virem” para geração de renda, tendo em vista uma diminuição dos direitos trabalhistas e a ilusão de um mundo Neoliberal onde “basta querer para conseguir seu espaço no mundo”.
Além do desmonte da educação básica através da Lei do teto de gastos (Lei 95/2016), redução dos investimentos em educação e desvalorização das universidades públicas, a proposta do novo ensino médio ainda dispõe de premissas para parcerias público-privadas para a formação Técnica e Profissional dos estudantes. Mas o que isso significa? Isso significa que as escolas não irão ter investimentos a fim de possibilitar essa formação dentro da própria estrutura da educação pública e assim, terão que fazer parcerias para que o currículo seja cumprido de maneira integral, causando uma grande oneração ao estado brasileiro a fim de gerar lucro para empresas privadas do capital internacional. Não podemos nos enganar pensando que essa educação técnica privada será de qualidade pois as normativas do NEM ainda dispõem de premissas para um ensino à distância (EaD), prejudicando ainda mais as camadas mais pobres da sociedade que ainda não possuem acesso à internet de qualidade.
No Paraná, temos vários exemplos de instituições de ensino em que o sinal de internet é precário, pois funciona através de um contrato antigo que considera a prestação do serviço através de satélite. Escolas quilombolas, escolas do campo e escolas de cidades muito pequenas não possuem sinal de internet qualificado até hoje pois a grande prestadora de serviço não se apresenta nestes municípios e instituições, afinal, gerar a estrutura necessária para que essa internet chegue à esses lugares gera gastos e sabemos que as empresas do capital financeiro só se preocupam com seu produto final: O LUCRO.
Outra grande questão é a personalização dos problemas do capitalismo através do viés ideológico do empreendedorismo juvenil. Os pensamentos neoliberais pregam que os problemas da sua vida são de única e exclusiva responsabilidade do indivíduo e nós sabemos que isso não é verdade. Além disso abre-se espaço para os chamados “Coachs”, pessoa que se dizem capazes de te ajudar a superar problemas através de filosofias capitalistas sem nenhuma evidência científica e capazes de gerar graves problemas psíquicos, tendo em vista a personalização e culpabilização do individuo em suas vitórias e derrotas. Sabemos que é dever do Estado Brasileiro dignificar a vida de cada cidadão desta nação, provendo uma educação de qualidade, permanência estudantil, seguridade alimentar e principalmente oportunidades de emprego e garantias salariais, além de direitos trabalhistas para pessoas negras, mulheres, LGBTQIAP+, populações periféricas e em situação de vulnerabilidade. Como podemos personalizar os problemas de uma nação sendo que muitos dos nossos, neste momento, estão morando em ocupações à beira de morros correndo risco de vida todos os dias? Esse problema não é de ninguém e sim do Estado.
Afinal, o que queremos para a educação pública brasileira?
A Educação que queremos é uma educação capaz de colocar os estudantes das camadas mais pobres como participantes ativos dos processos de ganho de conhecimento e desenvolvimento social. Queremos projetos de iniciação científica em todas as escolas públicas do Brasil, a fim de incentivar o desenvolvimento científico brasileiro em todas as etapas do ensino, ou seja, na educação básica, na graduação e na pós-graduação. Acreditamos que a emancipação da parcela mais pobre da nossa sociedade perpassa por uma educação realmente libertadora, capaz de transformar o futuro destas famílias que já foram deixadas de lado pelo estado brasileiro por tantos anos.
Sabemos que a educação é “Um ato libertador” como diria o ilustríssimo Paulo Freire (1921 – 1997), ou seja, com a educação podemos (enquanto nação) capacitar jovens para a transformação social, colocando as mazelas da sociedade como seres ativos neste processo. Precisamos ouvir as vozes das camadas mais pobres da sociedade e ainda mais, precisamos que essas camadas sejam capazes de propor mudanças reais com o viés econômico, social, de raça e gênero vivida por eles e por todos aqueles que se vêm em espaços de exploração e marginalização promovidos pela nossa sociedade elitista, branca e misógina. Precisamos de uma nova perspectiva para a educação brasileira, para assim, caminharmos para uma nova perspectiva de Brasil. Viva a educação pública, gratuita e de qualidade. Pelo retorno dos investimentos em educação! Pela revolução social e científica do nosso país. É isso que queremos!